Há algumas décadas, a má qualidade do ar já é comprovadamente associada a uma maior incidência de problemas respiratórios e cardiovasculares como câncer de pulmão e infarte; porém, novos estudos indicam que ela também pode causar danos ao cérebro, estando relacionada a inflamações, distúrbios de ansiedade e ao desenvolvimento de doenças neurodegenerativas como o mal de Alzheimer. Isso porque, recentemente, uma pesquisa conduzida pela Universidade de Lancaster, no Reino Unido, identificou pela primeira vez nanopartículas de metais provenientes da poluição atmosférica no cérebro, demonstrando que elas podem alcançar diretamente o órgão, onde então desencadeariam reações prejudiciais à saúde.
Na pesquisa, os cientistas fizeram análises dos cérebros de pessoas que viveram na Cidade do México, um dos lugares mais poluídos do mundo. Nessas amostras foram encontradas nanopartículas de magnetita, um óxido de ferro naturalmente presente no cérebro e demais partes do corpo, que desempenha funções em diversos processos biológicos – porém, as quantidades detectadas nessas populações se mostraram muito superiores. As amostras foram comparadas com o mesmo material coletado em Manchester, outro grande centro urbano com baixa qualidade do ar.
A magnetita produzida em condições normais pelo nosso organismo tem um formato anguloso, porém, nos cérebros estudados, a grande maioria das partículas encontradas era esférica, com diâmetros de até 150 nanômetros, e em quantidade muito superior ao esperado. Além disso, estas partículas esféricas estavam frequentemente acompanhas por nanopartículas contendo outros metais, como platina, níquel e cobalto – coquetel de substâncias similares às nanoesferas de magnetita que são comuns na poluição do ar em grandes centros urbanos, pincipalmente próximo a ruas movimentadas, e que são formadas pela combustão ou pelo aquecimento por fricção em motores e freios de veículos.
Presentes no ar, essas partículas acabam sendo inaladas pelas populações que vivem em locais com maiores índices de poluição. As maiores conseguem ser barradas pelo nariz, porém, as menores chegam à corrente sanguínea e pulmões, enquanto as minúsculas podem se ligar a nervos e seguir diretamente para o cérebro e, segundo as pesquisas realizadas, esses fragmentos de substância são capazes de quebrar conexões entre as células cerebrais, como acontece na doença de Alzheimer, por exemplo, além de desencadear inflamações que podem levar a distúrbios cerebrais mais graves e efeitos cognitivos.
Os cientistas estão cada vez mais preocupados com esses efeitos em especial na população infantil, que está mais suscetível aos males causados pela magnetita, pois crianças absorvem a substância com mais facilidade. Alguns pesquisadores estão começando a usar exames de ressonância magnética para identificar os impactos dos compostos poluentes no neurodesenvolvimento e mostrar mudanças concretas no cérebro dos pacientes, analisando em particular o grupo infanto-juvenil. Um estudo posterior da Universidade de Cincinnati analisou como a exposição à poluição do ar relacionada ao tráfego de veículos automotores pode afetar o cérebro em desenvolvimento e a saúde mental das crianças. Os cientistas analisaram exames de ressonância magnética de 145 crianças de 12 anos e usaram seus endereços para estimar sua exposição recente à poluição, incluindo partículas finas e nanopartículas. Depois de comparar os níveis recentes de exposição à poluição do ar relacionados ao trânsito, os sintomas de ansiedade e os dados de imagem cerebral dos pré-adolescentes, a equipe descobriu que crianças com níveis mais altos de exposição à poluição também relatavam sintomas de ansiedade mais generalizados. Crianças com sintomas maiores também tinham níveis mais altos de um produto químico chamado mio-inositol em uma área do cérebro que processa emoções, o córtex cingulado anterior. O mio-inositol é normalmente encontrado no cérebro, mas níveis anormais estão associados a distúrbios cerebrais.
Embora os cientistas ainda não tenham certeza de quais efeitos exatos a matéria particulada exerce sobre o cérebro, as evidências de uma associação causal são convincentes. Assim, é possível supor que tais partículas de magnetita possam causar ou acelerar o desenvolvimento de doenças neurodegenerativas e, portanto, maiores estudos devem ser conduzidos para traçar a relação exata entre a presença anormal da magnetita no cérebro humano e as enfermidades relatadas nos estudos.